domingo, 28 de dezembro de 2008

O homem ou é tonto ou é mulher

Disparate. Espera-se uma coisa e encontra-se outra, diferente. No meio da loucura a lucidez. Ou será o contrário? Talvez isso não importe, afinal, lucidez e loucura andam sempre juntas.

Nesse monólogo, Gonçalo Tavares mistura obsessões, fúrias, amores e loucura. Tudo amarrado em poesia. Nos deixamos levar pelo desvario de um louco furioso e, de repente, somos surpreendidos por uma idéia, algo que desprende do texto, capaz de abalar o raciocínio mais lúcido.

O texto flui, a narrativa prende. O personagem desloca-se muito à vontade de uma página a outra, de um tema a outro.

Este é o primeiro livro que leio de Gonçalo Tavares. O próximo será “Jerusalém”, romance vencedor do Prêmio Portugal Telecom de Literatura em 2007.

Ficha Técnica: "O homem ou é tonto ou é mulher", de Gonçalo M. Tavares, Editora Casa da Palavra

Equador

Descobri que não conheço nada da história de Portugal. Aquilo que eu pensava conhecer é nada mais do que história do Brasil, ou, melhor, a parcela da história do Brasil na qual Portugal tem papel de destaque.

Por isso, ler Miguel Sousa Tavares sempre desperta minha curiosidade. Claro, trata-se de ficção. Mas, bem ou mal, vários incidentes reais do percurso de Portugal são mencionados, revisitados e reinventados.

Ao ler sobre a relação de Portugal com suas outras colônias é impossível não pensar em sua relação com o Brasil e nos desdobramentos das decisões tomadas em 1808.

Passei boa parte do livro me angustiando com a inaptidão do personagem para o cargo de governador de São Tomé e Príncipe, mas torcendo por ele. Sufocada pelo calor úmido da ilha, transpirando, sentindo seus cheiros e gostos.

Até onde sei, trata-se do primeiro romance de Miguel Sousa Tavares. Mas li, antes dele, “Rio das Flores”. De alguma forma, “Rio das Flores” me parece uma evolução de “Equador”. Há um equilíbrio maior, um domínio maior do autor sobre os diversos elementos da narrativa. Gostei de “Equador”, mas me encantei com “Rio das Flores”.

Ficha Técnica: “Equador”, de Miguel Sousa Tavares, Editora Nova Fronteira

domingo, 30 de novembro de 2008

Uma gentileza

São Paulo é uma cidade maluca. São tantos contrastes, tantas misturas que deixam a gente até tonta.

Hoje eu estava perdida, dentro de um ônibus, sem saber direito se eu conseguiria chegar ao meu destino. De mau humor, claro.

Estava descendo a Cardeal Arcoverde quando perguntei à mulher ao meu lado se o ônibus passaria pelo Largo de Pinheiros.

Tinha quase certeza de que sim, mas achei melhor confirmar. Minha companheira de ônibus, não só confirmou, como, perguntou para onde eu iria e passou a explicar detalhadamente o caminho, sem que eu sequer pedisse.

Se aplicou tanto a essa tarefa que acabou deixando passar seu próprio ponto e teve que descer no seguinte.

Ainda não satisfeita, consultou o cobrador antes de descer e fez um sinal pra mim só para confirmar que a orientação dada estava correta.

Desci do ônibus pouco depois, no lugar indicado por ela, e cheguei onde eu queria. Sem erros, sem desvios.

Melhor: cheguei de bom humor, alegre pela gentileza. E, acima de tudo, agradecida.

sábado, 29 de novembro de 2008

O outro pé da sereia

Atravessando mundos e séculos, Mia Couto narra histórias paralelas, separadas por séculos e culturas, mas estranhamente próximas.

Como pano de fundo, a religião, as crenças e os reflexos de povos que se esbarram, se encontram, se misturam, se chocam e se fundem.

Você pode ler o livro como se ele falasse de mundos distantes, exóticos, apartados do nosso. Mas, sinceramente, não acredito nisso. Prefiro ver no texto um outro olhar sobre nós mesmos, nossas origens, nossa história.

Em 1560, D. Gonçalo da Silveira leva uma imagem de Nossa Senhora desde a Índia até Moçambique. Viaja para catequizar.

Em 1560, Nimi Nsundi, viaja da Índia a Moçambique como escravo, mas serve à Kianda, a deusa das águas, também cativa da nau dos portugueses, presa numa estátua de madeira, ordenando ser libertada.

Em 2002, de novo a estátua. Se da santa, se da deusa, não sei. Mas, dessa vez, quem anseia por liberdade é outra personagem: Mwadia, a canoa, aquela que faz a travessia, a passagem.

Costurando por esses retalhos, o autor constrói sua história. Com humor e inteligência.

O outro pé da sereia revela um pouco de uma cultura distante e próxima, a da África de língua portuguesa. É um bom livro para se conhecer um pouco do trabalho de Mia Couto.

Ficha Técnica: "O outro pé da sereia", de Mia Couto, Editora Companhia das Letras.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Um terno de pássaros ao sul

“Um terno de pássaros ao sul” é uma espécie de acerto de contas. Acerto de contas de um poeta, frise-se. Menos com uma pessoa – seu pai – e mais com o passado, com a história de cada um, com a vida em todo o seu potencial humano.

Entre pessoas tecidas para o amor e amortecidas por ele, o poeta faz sua viagem entre passado e presente, infância e maturidade.

“Quando nasceram os filhos, amaste teus escritos. Quando nasceram os netos, amastes teus cachorros. Quando vamos coincidir?”

Talhado para o amor e amortalhado por ele, o poeta filtra decepção, dor, amor, reconhecimento. Não se trata de perdão, mas de aceitação. O menino e o homem se fundem ao texto. Primeiro filho, agora pai, o poeta se recompõe.

“Tivemos a coragem de superar o começo, não transformar a filiação em carta de guerra, imitação da treva.”

O abandono e o reencontro. A dureza das palavras contrapostas ao pedido da criança: “Volta ao pampa, pai”. “Volta ao pai, pampa.”

Ficha Técnica: "Um terno de pássaros ao sul", de Fabrício Carpinejar, Editora Bertrand Brasil.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

A criança em ruínas

Um livro dolorido. Ausência, dor, separação, perda. Saudade de um tempo passado, de uma infância que já não existe mais. Saudade de uma parte da vida já vivida e que, por isso, não existe mais. Ou existe. Mais do que nunca, pois não pode mais ser alterada ou esquecida ou retocada.

A imagem de uma criança em ruínas não é exatamente agradável. Mas na infância retratada pelo poeta, as crianças parecem ser crianças. A infância tem cara, jeito, gosto de infância. Na verdade, a idéia que fica é a da passagem do tempo. Da criança que deixou de ser criança porque cresceu. E do adulto que, de algum modo, se ressente com isso.

Mais do que síndrome de Peter Pan, a nostalgia da infância surge como uma espécie de resgate da ausência, uma recomposição do conceito de família, do conforto e da segurança que, na vida adulta, são tão difíceis de recuperar.

Um livro apaixonante.

Ficha Técnica: "A criança em ruínas", de José Luís Peixoto, Editora Quasi.

Canalha! - uma introdução

Nesta última sexta-feira, fui ouvir Fabrício Carpinejar falar sobre seu novo livro de crônicas: “Canalha!”. O tema do encontro: “Feios, limpos e malvados”. O parceiro: Xico Sá. Enfim, diversão garantida.

Carpinejar já havia postado em seu blog alguns textos sobre o livro, além de matérias publicadas na imprensa. Nesses textos, ele apresenta seu conceito de canalha, fazendo as devidas distinções entre cafajestes e afins.

O que eu pude entender disso tudo é que o canalha é um eterno apaixonado. Inconstante, impulsivo e descompromissado. É o cara que, quando está com você, é completamente seu. Não poderia haver melhor companhia. É aquele que te olha e não precisa dizer nada para você se sentir a mulher mais interessante do planeta. Que seduz, cativa e consome. O canalha sempre põe a mão no lugar certo, na hora certa. E, quando não está afim, simplesmente desaparece para reaparecer num outro dia qualquer, sem aviso, sem notícia.

Pode haver coisa melhor que isso? Claro, eu não recomendaria um canalha para quem quer constituir família. Mas, se a sua já estiver constituída, ou desconstituída – ou, ainda, em qualquer fase desse processo –, o canalha me parece ser uma ótima opção.

Para mim, o canalha é a versão moderna do príncipe encantado. E já estava na hora dele se atualizar, afinal, nem nos desenhos animados os velhos príncipes estão em alta. Em Shrek, por exemplo, entre o Encantado e o ogro, quem não escolheria o ogro?

O canalha aparece quando você já desistiu de esperar por ele e se desdobra para te conquistar mais uma vez, para fazer todas as suas vontades. Depois some de novo. Não dá tempo de enjoar. Deixa para trás algo mal resolvido, o fiozinho do novelo, a retomada possível. Além de tudo, é discreto. Não sai contando vantagens por aí, o que amplia ainda mais seu raio de ação – sem distinção de credo, raça ou conta bancária –, sem pudores ou constrangimentos.

Claro que essas idas e vindas podem ser difíceis de suportar. O canalha está sempre de passagem. Mas isso o torna absolutamente previsível. Namoros, casamentos e tudo mais é que são complicados, pois, teoricamente, são feitos para durar. Mas por quanto tempo? Quanto dura um casamento, uma paixão, um relacionamento?

Com o canalha, não há esse problema. Não vai durar e pronto. Muito mais fácil. E isso obriga ambas as partes a aproveitarem cada instante da melhor maneira possível.

Na verdade, acho que o maior problema é de ordem quantitativa. Não é fácil ser canalha. Satisfazer uma mulher, mesmo que esporadicamente, não é para qualquer um. É preciso muita competência e uma boa dose de talento. Canalha de verdade, digno do nome, há poucos por aí.

Bom, só queria registrar aqui minhas primeiras impressões sobre o que ouvi falar e li a respeito de "Canalha!". Agora vou direto à fonte, acabei de comprar o livro. Vamos ver se essa primeira percepção se sustenta.

Por ora, que venham os canalhas!

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Crise Financeira

Dona Maria entra no armazém da esquina e cumprimenta o dono. Minutos depois, coloca sobre o balcão a compra do dia e a caderneta do fiado.
- Xi, dona Maria, agora não tem mais fiado, não. Só vendo à vista.
- Como assim, seu João, eu sempre comprei com caderneta. E paguei em dia.
- É a crise, dona Maria, é a crise.
- Que crise?
- Essa aí, da televisão, a crise financeira.
Seu João falou arregalando os olhos e se demorando em cada sílaba da fatídica crise.
- Essa dos bancos?
Dona Maria estava antenada.
- É, essa danada.
- Mas o senhor não é banco, seu João. Aliás, nem conta o senhor tem que eu sei!
Era verdade, mas não fazia a menor diferença. Seu João não tinha dinheiro no banco mas sabia que os bancos eram especialistas em fazer dinheiro. Enfim, um exemplo a seguir.
- A senhora nunca ouviu falar em globalização, dona Maria? Essa crise é assim, globalizada. Mesmo eu não sendo banco, ela vai chegar até aqui. Vai faltar crédito na praça. Se nem os bancos vão emprestar, como é que eu vou me arriscar?
Dona Maria já ia a perder a paciência, mas se conteve a tempo. Respirou fundo e voltou à carga com novos argumentos.
- Mas essa crise não é de verdade, seu João. O senhor não ouviu o presidente na TV outro dia? É crise de confiança. Agora só falta o senhor dizer que não confia aqui, na sua comadre.
Seu João coçou a cabeça, pensativo. Confiar, confiava, mas sempre desconfiando. Entre confiar nos bancos, porém, ou na comadre, acabou optando pela alternativa mais segura.
- Vá lá, dona Maria, vá lá. Me passe essa caderneta.
Dona Maria sorriu, satisfeita. Agora era torcer para a crise não levar o emprego do marido, caso contrário, como é que ela iria pagar a caderneta?

domingo, 26 de outubro de 2008

Como no céu / Livro de visitas

É difícil ser racional quando o tema é poesia. De que adianta admirar a originalidade do tema, o domínio da linguagem, a melodia, a fluidez do texto se essa poesia não te emociona? Se todas essas letras e palavras que se juntam não te comovem?

A poesia é passional. É relação a dois. Ela precisa tocar em algum ponto sensível e esquecido de si mesmo. Você precisa passar dias arrastando o livro de um lado para outro dentro de casa, na bolsa, espalhando papeizinhos para marcar os poemas que tem que reler, abrir uma página à toa e ler mais um antes de dormir, grifar uma palavra, uma frase, uma página – mas, a lápis, para não estragar o livro. É preciso espalhá-los pela cama.

Com o Carpinejar foi assim. Li uma poesia numa matéria de jornal, depois uma matéria assinada por ele numa revista. Peguei um livro dele para folhear, escolhi pela capa, numa livraria. Jurei que só ia olhar. Comprei. Li e adorei. Paciência. Não se pode negar a própria natureza!

Gosto da supremacia das idéias – aparente ou não – sobre o texto. Gosto das palavras simples e gosto do gosto das palavras.

Ficha Técnica: "Como no Céu / Livro de Visitas", de Fabrício Carpinejar, Editora Bertrand Brasil.

Gaveta de papéis

Cada vez que leio, encontro algo novo. Da primeira vez, a curiosidade me fez ler tudo na mesma hora. É um livro pequeno e rápido. Terminei e fiquei perdida.

Comecei outra vez. Então com calma. Um poema por vez. Mentira, não consigo ler um por vez. Mas poucos por vez. Primeiro em pensamento, depois em voz alta. Sempre faço isso. Preciso ouvir o som das palavras.

Senti ciúme do poeta. Das viagens, dos amores, das emoções, sensações. Ciúme ou inveja. Difícil dizer. É bom partilhar das emoções alheias, extravasar, exorcisar as nossas nelas. Mas isso também me lembra da minha incapacidade de exorcisar as minhas próprias, sem escadas, sem muletas, fugas, escapatórias. O texto de Peixoto é uma espécie de vício.

Rio das Flores

Fiel a minha fase “portuguesa”, acabo de ler “Rio das Flores”, de Miguel Sousa Tavares. Conheci o autor por acaso, mudando os canais da TV e dando com ele no Roda Viva. Foi assim que resolvi ler o livro. A história se passa entre Portugal e Brasil. O autor narra a história de uma família portuguesa, mais precisamente de dois irmãos, na primeira metade do século XX, no entre guerras.

Os personagens conquistam com facilidade, a narrativa flui como o rio do título. Dá para sentir o cheiro do ar. Do calor do Brasil. Do calor e do frio de Portugal. Da terra.

Irmãos que se amam apesar das diferenças. Que se decepcionam um com o outro, que não se compreendem, que assumem posições opostas na vida. E se amam. E são irmãos.

Há uma sensação de “pertencimento” que atravessa toda a obra. Dos personagens com a terra e das mulheres com os homens. Não se trata de amor. O amor é outra coisa. Mas sim de sentido, direção, diretriz, razão de ser. A relação homem-mulher no viés do macho e da fêmea, sem que isso signifique submissão ou humilhação ou simples apelo ao sexo. A eterna ânsia da completude. A noção e o reconhecimento dessa necessidade atávica, inata, fisiológica. E a sensualidade que perpassa os cenários, diálogos e corpos que se tocam ou não.

O modo como a história da família se contorce e se confunde com a historia de Portugal, do Brasil e do mundo é apaixonante. A vida, as decisões de cada um, o destino são induzidos, conduzidos, confundidos com a história de todos, de nações inteiras, de continentes e mundos. Separados e indissociáveis simultaneamente.

Há uma reflexão necessária nisso tudo. Quando os irmãos, assumindo posições opostas numa guerra deflagrada e buscada, se confrontam, não se pode recusar a similitude, a semelhança. A guerra é guerra por si só. Todos os lados são maus. Todos guerreiam. E lutar é lutar. Somos todos iguais nesse instante. A violência instala-se de lado a lado. Não há bem ou mal, mocinhos e bandidos. As atrocidades de um lado são ‘contrabalançadas’ pelas atrocidades do outro.

Engraçado o olhar português sobre o Brasil, muitas vezes carinhoso. Parece que eles se identificam mais com o Brasil do que o Brasil com eles. O Brasil como alegria. Sem o ranço, sem o peso, o cansaço, a tristeza e a idade da Europa. A juventude do Brasil. O país por descobrir. O tamanho, a largueza das fronteiras.

E, entre tantas alegrias e tristezas, amores e traições, a catarse: “Queres mesmo?” “Quero muito.” É preciso ler.

sábado, 25 de outubro de 2008

Seda

Difícil escrever sobre Seda. Antes de mais nada, não sei dizer o que é. Um conto? Uma fábula?

É uma história. E isso basta. Uma história de amor. Não só o amor romântico, mas o amor amigo, companheiro. Pessoas que se importam e que cuidam umas das outras.

Um homem de negócios, bem sucedido, que entrega a sua vida aos caprichos da sorte. Ou, talvez, não se trate disso. Talvez a disputa não seja com a sorte, mas com si mesmo.

O senso dever e obediência, suplantado por uma paixão. Não por uma mulher, mas pelo desconhecido, pelo mundo talvez.

E, no final, o amor de uma mulher. Sempre o amor de uma mulher.

Ficha Técnica: "Seda" (2007), de Alessandro Baricco, Companhia das Letras

domingo, 5 de outubro de 2008

Eleições 2008

Fim de semana de eleição. O máximo que pude cumprir do meu dever cívico foi justificar minha ausência. Ausência de interesse pelos debates dos candidatos na TV e nos jornais. Ausência de capacidade em confiar que o destino da cidade será melhor ou pior nas mãos deste ou daquele político. Ausência de vontade de brigar por mudanças. Ausência de paciência para filas. Ausência de arrependimento por ter votado em um ou outro.

A verdade é que não acredito que a política faça diferença. O governo é reflexo do que nós somos. Não acredito que alguma mudança possa ocorrer por meio de voto. Acho que qualquer mudança no governo virá sempre como conseqüência daquilo que somos como povo.

domingo, 14 de setembro de 2008

A Eternidade e o Desejo

Ouvi Inês Pedrosa pela primeira vez na FLIP deste ano. Gostei e tive vontade de conhecer um pouco do seu trabalho. Comecei por “A Eternidade e o Desejo”.

O livro traz vários excertos dos sermões do Padre Antonio Vieira. São realmente impressionantes. Vale a pena ler e reler alguns desses trechos. E, às vezes, é preciso suspender a leitura do romance por alguns minutos para absorver esse primeiro impacto. Esse é o problema dos bons livros, quando você termina, sua lista de leituras está ainda maior. Preciso ler esses sermões.

Mas, voltando à Pedrosa e ao seu livro, mais uma vez o modo como os autores portugueses lidam com a língua me impressiona. A forma como a palavra sai das mãos de Clara para as de Sebastião e, deste, de volta para ela, é admirável. O modo como os diálogos são desenvolvidos também. Essa é uma marca do livro, a fluidez do texto. Natural, fácil e, ao mesmo tempo, construída com esmero, em detalhes.

Clara é a personagem central da trama. Cega, após levar um tiro, volta à cidade onde perdeu a visão para resgatar a si mesma. Essa cidade é Salvador, na Bahia. É interessante ver, através de Clara, a visão do estrangeiro em relação à Bahia.

Clara é insuportável. Áspera e rude com seu amigo, e insuportavelmente humana. Mas, dos dois, Sebastião é o que mais precisa de ajuda. Clara procura um caminho e tem coragem de seguir as pistas que encontra. Sebastião parece preso, empacado em algum lugar, incapaz de se mover.

E é a mulher quem define o destino de ambos. Não sei se pelo fato de a autora ser mulher ou se pelo fato de ser Inês Pedrosa – pelo pouco que sei e vi dela, estou convencida de que Inês é uma mulher de opinião forte.

A capa é um capítulo à parte. Simplesmente linda. Em primeiro plano, as fitinhas coloridas do senhor do Bonfim, iluminadas de sol. Ao fundo, a imagem desfocada do que parece ser um museu, um dos tantos mencionados ao longo do livro, em tons escuros e sóbrios.

É um livro pequeno e fácil de ler, com muito a acrescentar a quem se empenhe nele.

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Cemitério de Pianos

Neste último sábado, numa sala amarela, ouvi o autor de “Cemitério de Pianos” falar sobre seu livro. Da janela, um ipê carregado de flores amarelas completava o quadro.

José Luís Peixoto é português, tem 34 anos e é fã de heavy-metal, assim como parte da platéia ali reunida. Falou pouco mais de uma hora, num tom de voz manso que sempre me parece um pouco tímido. Falou do seu trabalho e da sua vida espelhada nele.

Cemitério de pianos conta a história de uma família. Três gerações de Franciscos Lázaros que se sucedem e se misturam. Os narradores se alternam a ponto de, muitas vezes, não sabermos mais quem é que nos conta a história.

A repetição dos nomes de uma geração para outra contribui para se criar essa ilusão, assim como o fato das respectivas mulheres não terem nomes próprios. Como se fosse sempre uma mesma história. Como se não fizesse diferença ser avô, pai ou filho.

Em vez de tentar agarrar-se à linha da narração, anotando nomes ou coisa parecida, melhor deixar a história fluir. É preciso confiar no autor e deixar que ele te conduza. Como naqueles desenhos 3D que escondem a verdadeira imagem numa repetição sem sentido de figuras. Você só encontra a imagem real se conseguir relaxar, mudar o foco da visão, aguardar que a figura surja.

O ponto de referência dessas histórias entrelaçadas, das histórias de cada um desses personagens ou, se preferir, desse único personagem, é uma oficina de carpintaria. Mais precisamente, uma sala dentro dessa oficina, um local onde estão empilhados dezenas de pianos em frangalhos, destruídos, irrecuperáveis - o “cemitério de pianos”, que dá título ao livro.

Um galpão empoeirado onde se acumulam carcaças, restos de pianos que nunca mais serão tocados. Pelo menos, não aqueles. Mas daqueles corpos de madeira sem vida sairá a peça que será usada para se fazer música novamente. O germe da música está ali, latente, esperando ser jogado em terreno fértil para germinar.

A música está presente o tempo todo, do piano do título, do som que sai do rádio logo na primeira cena – é a música que nos leva ao primeiro personagem – do cemitério de pianos, na alma de todos os Lázaros. Do que se apaixona pela moça da pensão ao qual é levado por um pianista, do que se apaixona pela própria pianista. Até o modo como amam é o mesmo, como se as cenas se repetissem.

Engraçado que, ao falar de seu livro, Peixoto refira-se à música só ao final, como se esse elemento não fosse assim tão forte. Mesmo durante a maratona, onde quase não ouvimos o som, mas apenas a torrente de palavras que correm na mente do personagem. Nessas passagens, a ausência da música é tão eloqüente quanto sua presença. Lembrando que a relação do autor com a música é muito forte, impossível evitar esse pensamento.

A música está presente no cemitério de pianos, impregnada no ar, transformada em algo concreto e palpável. E a paixão que ela inspira também. O Franciscos não apenas consertam pianos com o quem conserta um banco. Eles trazem a música de volta ao mundo, fazem nascer essa música, são apaixonados por ela. Há uma espécie de veneração a amarrar isso tudo.

E isso é reconhecido pelos personagens. O cemitério é trancado por anos, como que para impedir a música e o amor que vem com ela, indissociável, como se para apagar uma história, uma lembrança, uma dor. Ou será por ciúme? Ou por vingança? E enquanto o cemitério de pianos permanece trancado, a história segue suspensa, a espera. Só volta a fluir quando ele é de novo aberto. Então tudo recomeça. A mesma história uma e outra vez.

Peixoto lembrou das referências bíblicas. De Lázaro, que é ressuscitado por Cristo, como parece ressuscitar em seu filho, e no filho do seu filho e assim eternamente. De Marta e Maria, irmãs de Lázaro. De Simão, pai de Judas e também o leproso. Apontou a Bíblia como sendo forte referência em seu trabalho.

Exposição
Mas o que mais me chamou a atenção ao ouvir o autor neste sábado, e que acabei deixando para mencionar só ao final, foi seu comentário a respeito de uma das cenas do livro, tirada de uma cena real: a espera de um telefonema para comunicar a morte do seu pai. Essa era a pergunta que gostaria de fazer e não fiz. Como se dosa isso, essa exposição, essa relação obra e autor?

Peixoto parece tímido, mas desses tímidos corajosos e bem humorados que não se deixam intimidar com a própria timidez. Como se pode olhar para pessoas desconhecidas e falar sobre a morte do seu pai? Deve ser muito difícil lidar com essa imagem pública, com esse papel de autor. Especialmente quando se escreve.

Eu acredito que seja mais fácil conhecer um autor lendo seu trabalho do que falando com ele, convivendo com ele. Por isso, ainda me assusto com essa perspectiva de exposição, com essa falsa sensação de proximidade, de identificação.

Língua
Gosto do jeito como alguns autores portugueses lidam com a língua. É o caso do Peixoto. Invejo a confiança e a segurança. A proximidade. A intimidade. A liberdade com que subvertem as regras e moldam as palavras, as letras, os pontos e vírgulas. Não consigo evitar a idéia de que, afinal, a língua é deles antes de ser nossa. Nós herdamos. Para eles, é inata. Têm séculos de convívio antes de nós. Isso deve fazer diferença.

Controle
Em determinado momento, alguém fez algum comentário relacionando “Cemitério de Pianos” com outro livro do autor, na verdade, o primeiro a ser publicado, “Nenhum Olhar”. Peixoto fez um comentário ótimo a esse respeito. Lembrou que “Nenhum Olhar” foi escrito numa situação única, impossível de se resgatar ou repetir. O livro foi escrito sem a perspectiva de que seria lido, sem observadores.

Agora escreve sabendo que será lido, observado, comentado, analisado. Nunca mais um escritor num quarto sem janelas.

“Cemitério de Pianos” foi meu primeiro contato com a obra de José Luís Peixoto. Terminei e já li, em seguida, “Nenhum Olhar”. Também descobri que esses são os dois únicos livros dele publicados no Brasil. Uma pena.

José Luís Peixoto escreve prosa como se escrevesse poesia. Conheço pouco do trabalho dele, mas não há como evitar uma espécie de encantamento.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

Nenhum Olhar

O que dizer de um lugar em que os casamentos são celebrados pelo diabo? Em que o tempo corre diferente para um único homem, que, embora envelheça, não morre nunca? Em que irmãos siameses permanecem ligados por um só dedo? Em que há prostitutas de olhos vazados e carpinteiros sem perna ou braço?

Resignação e inexorabilidade. Esse é o universo desse livro-fábula, onde, apesar do estranhamento, a vida se revela como sempre, como em qualquer outro lugar, sob um sol inclemente e o olhar manso, de cordeiro, de um pastor. Esse é o universo criado pelo autor para contar sua história.

Você pode se perder entre as referências e simbologias, brincando de adivinhar o que representa o quê. É divertido se enveredar pelas metáforas. Será que a falta dos membros representa uma alma amputada? Será que ausência de olhos representa a incapacidade de chorar ou ver, recurso necessário para suportar um destino inglório? E a resignação de José? E a ausência total de redenção?

Já neste livro, a repetição dos pais nos filhos, que o autor retoma em outros trabalhos, é marcante.

Mas, enquanto ficamos buscando sentido para a história, tentando imaginar como acaba, qual será o seu desfecho, é o próprio sentido da vida que está em jogo. Se é que a vida precisa de sentido.

É um livro duro, permeado por um desespero que eu não sei se é do autor ou meu. A resignação do pastor ao seu destino. O amor seco e gasto dos personagens, como se já tivessem vivido vezes sem fim aquelas mesmas vidas, aquelas mesmas dores.

Nenhum olhar é uma fábula que fala da vida, do amor e da morte. A linguagem é uma espécie de personagem. Tem corpo, textura, vontade. Conduz a história, controla seu ritmo, hipnotiza. Peixoto escreve prosa como quem faz poesia. Não deixa nunca de ser poeta.

O movimento também merece atenção. As cenas são compostas em camadas. Cada personagem faz a sua narrativa e assim compõe-se a cena final. Numa espécie de sedimentação. Como a areia na beira de um rio.

Para variar, fiquei procurando deus, ora no escritor que escreve num quarto sem janelas, ora no homem que parece controlar o tempo.

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Bernardo Carvalho

Acabei de voltar de um evento no Instituto Goethe, sobre literatura. Na mesa, destaque para dois autores de língua alemã, Perikles Monioudis e Ulrich Peltzer. Mas quem garantiu o sucesso da noite foi mesmo o Bernardo Carvalho, o terceiro autor.

Não conheço o trabalho dele, mas, pela amostra de hoje, fiquei com vontade de conhecer. Bernardo passou dois meses viajando pela Mongólia para escrever um de seus livros mais recentes, com esse título. Aqui no Brasil, embrenhou-se no mato para escrever a história de um antropólogo inglês, eu acho, que acabou se suicidando numa tribo indígena. E tudo começou por conta de uma nota lida no jornal.

Na verdade, não sei se gostei dele ou se fiquei foi com inveja das histórias que ele tinha para contar.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

A guerra da Rússia

A foto de capa da Folha de hoje é perfeita. Dois homens abraçados. Um vivo, o outro morto. Ambos jovens, fortes. Homens que parecem ser capazes de se defender e de defender você. A dor estridente imobilizada na folha de um jornal, circulando pelo mundo, espalhando-se, contaminando. Isso sem falar na internet. Uma dor multiplicada por milhares e milhões. Ainda assim, inútil, inerme, incapaz de trazer de volta à vida aqueles dois homens.

E a Ossétia do Sul? Desculpem a ignorância, mas eu nunca havia prestado atenção a esse tema. Não sabia do movimento separatista, nem imaginava possível a intervenção da Rússia na Geórgia.

Quanto ao Putin? Infelizmente, desse, eu já ouvi falar.

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Fim de Festa

A Flip chegou ao fim. O horário da última mesa – 17h – foi muito bem escolhido. Com o fim da festa, acabava também o dia.

Cada um dos oito autores presentes – Chimamanda Adichie, Nathan Englander, Zoë Heller, Neil Gaiman, Cintia Moscovich, Alessandro Baricco, Tom Stoppard e Cees Nooteboom – leu um trecho do livro que escolheu especialmente para a ocasião.

A aparição de Liz Calder, idealizadora da Flip, deu um charme a mais à ocasião, e um toque de pessoalidade que combinou com o evento. A Flip é uma festa, e não uma feira. E isso é evidenciado o tempo todo.

Foi uma ótima festa.

Pena que acabou.

Para os curiosos, segue a relação dos livros selecionados pelos autores:

Chimamanda Adichie – “The Autobiography of My Mother”, de Jamaica Kincaid.Nathan Englander – “Goodbye, My Brother”, de John Cheever.
Zoë Heller – “The Member of The Wedding”, de Carson McCullers.
Neil Gaiman – “Thirteen Clocks”, de James Thurber.
Cintia Moscovich – “De Amor e Trevas”, de Amóz Oz.
Alessandro Baricco – “O Apanhador no Campo de Centeio”, de J. D. Salinger.
Tom Stoppard – “In Our Time”, de Ernest Hemingway.
Cees Nooteboom – “Em Busca do Tempo Perdido”, de Marcel Proust.


Flip 2008
Mesa 19 - Livro de cabeceira - NATHAN ENGLANDER, CHIMAMANDA ADICHIE, NEIL GAIMAN, TOM STOPPARD, CINTIA MOSCOVICH, CEES NOOTEBOOM, ALESSANDRO BARICO, ZOË HELLER
Mediador: ÁNGEL GURRÍA-QUINTANA

Wisnik e Damatta

Nunca pensei o futebol como um fenômeno social. Foi realmente uma surpresa. Wisnik e Damatta, com abordagens e estilos distintos, deram novos contornos para o tema. Mesmo para quem não gosta de futebol, como eu, a reflexão foi realmente instigante.

A idéia do futebol como um mundo paralelo, em que existem regras, que valem para todos e são respeitadas, ao contrário do nosso Mundo-Brasil, é interessante. No futebol, em certa medida, a desigualdade social seria superada e haveria um senso comum de justiça: as transgressões seriam punidas.

Também a visão do futebol inserido em determinado período da história foi novidade para mim. Sua chegada ao Brasil como algo ‘alienígena’, uma espécie de estrangeirismo, e o processo de assimilação e de transformação dessa novidade em algo que, acreditamos hoje, genuinamente ‘brasileiro’.

A eloqüência de Wisnik e a lucidez do seu discurso, apesar da dificuldade de ir direto ao ponto, e o humor sério e um tanto cínico de Damatta, combinados, funcionaram bem. Muito bem. Quanto ao mediador, Matthew Shirts, este deixou o barco correr.

Nunca mais vou pensar em futebol da mesma maneira.

Flip 2008
Mesa 17 - Folha seca - JOSÉ MIGUEL WISNIK, ROBERTO DAMATTA
Dia 06/07, às 11h45
Mediador: MATTHEW SHIRTS

domingo, 6 de julho de 2008

Tom Stoppard

Eu já sabia que o Luis Fernando Veríssimo era tímido, mas, ainda assim, a timidez dele me surpreendeu. Veríssimo L-E-U suas perguntas. Engraçado, não? Claro que ele é ótimo e, mesmo lendo, é um prazer ouvi-lo. Mas houve certo estranhamento. Como não poderia deixar de ser, as perguntas do Veríssimo carregavam uma boa dose de humor. Não de um humor qualquer, mas do humor do Veríssimo, com o qual Stoppard – a estrela da mesa – não estava familiarizado (ele confessou ter lido – e gostado de – um livro do Veríssimo na noite anterior pela primeira vez).

Enfim, Veríssimo provocou, Stoppard não entendeu e, simplesmente, respondeu a pergunta. Foi um pouco frustrante. Daí pra frente, Veríssimo optou por seguir o caminho mais seguro e fazer perguntas convencionais, de forma convencional. Ou seja, a conversa não esquentou.

Acho que teria sido melhor se Veríssimo fosse mais um convidado, ao lado de Stoppard, e que uma terceira pessoa tivesse sido escolhida como mediadora.

Mas, ainda assim, valeu a pena. Pra mim, que não conhecia absolutamente nada sobre Stoppard, ficou a vontade de conhecer melhor o trabalho dele. Principalmente depois de ele chamar a atenção para uma distinção que eu achei ótima: a diferença entre "categoria" – na verdade, essa palavra não me parece muito adequada, mas, por hora, não tenho outra – e qualidade.

Segundo ele, o que importa é a qualidade. E você pode encontrá-la em qualquer categoria - num texto literário ou numa revista de fofocas. Ou seja, falando de diálogos do cinema ou do teatro, especialidade de Stoppard, a frase perfeita pode ser encontrada tanto num filme do Indiana Jones como num texto de Shakespeare.

Adorei ouvir isso.

Flip 2008
Mesa 15 - Shakespeare, utopia e rock’n’roll - TOM STOPPARD
Dia 05/07, às 19h
Mediador: Luis Fernando Veríssimo

Nooteboom e Vallejo

Desculpem, mas o destaque da mesa foi mesmo o mediador, Ángel Gurría-Quintana. Ao contrário da grande maioria dos mediadores da Flip, esse, sim, sabia o que estava fazendo. Conhecia a função. E a desempenhou muito bem.

Vallejo não estava pra conversa. Só repetiu o discurso que já havia sido notícia dos jornais da véspera e do dia. Mas, ainda assim, Ángel conseguiu tirar alguma coisa dali. A impressão final de Fernando Vallejo foi a de alguém tímido, que parecia estar ali a contragosto. Mas, pela leitura que fez de trecho de um livro seu, deu vontade de conhecer melhor o trabalho dele.

Na verdade, essa mesa foi muito bem composta. Nooteboom fez o contraponto perfeito a Vallejo. Saiu-se bem de qualquer tentativa de provocação e conseguiu falar do seu trabalho. Isso sem falar que ele é a simpatia em pessoa.

Flip 2008
Mesa 14 - Paraíso perdido - CEES NOOTEBOOM, FERNANDO VALLEJO
Dia 05/07, às 17h00
Mediador: ÁNGEL GURRÍA-QUINTANA

Baricco e Calligaris

Confesso que já fui predisposta a gostar, mas são ambos ótimos mesmo. O tema da mesa não passou de ficção, como em quase todas as outras. Mas isso é mera observação, apenas uma curiosidade, afinal estávamos todos lá pelos palestrantes, e não pelo tema em pauta.

A frase do dia foi de Calligaris ao falar da importância das raízes, mas de raízes como as das bromélias, que crescem ao ar livre.


Flip 2008
Mesa 13 - Fábulas italianas - ALESSANDRO BARICCO, CONTARDO CALLIGARIS
Dia 05/07, às 15h00
Mediador: MANUEL DA COSTA PINTO

Gaiman e Price

Neil Gaiman é o mais conhecido por aqui, por conta de Sandman, e pagou um bom preço por isso: passou horas autografando seus livros. Muito paciente e simpático.

A conversa foi boa. Gaiman e Price falaram sobre seus respectivos trabalhos como roteiristas e da difícil negociação com produtores de cinema.

Foi bom também conhecer um pouco mais do trabalho de Gaiman, inclusive como autor de livros infantis.

Flip 2008
Mesa 12 - A mão e a luva - NEIL GAIMAN, RICHARD PRICE
Dia 05/07, às 11h45
Mediador: MARCELO TAS

Adichie e Pepetela

Chimamanda Ngozi Adichie é uma escritora nigeriana. Bastante jovem. Fala do seu trabalho com uma naturalidade que impressiona. E, com o pouco fala, desperta minha curiosidade. O título é ótimo “Meio sol amarelo”. O tema, a guerra em Biafra. Mas o olhar da escritora sobre o tema é o que mais desperta meu interesse.

Pepetela já é escritor consagrado, embora eu ainda não conheça o trabalho dele. Fala de sua vivência como guerrilheiro. É difícil associar a sua figura pacífica a um cenário de guerra. Um escritor guerrilheiro de corpo fechado, mas de alma aberta, como ele faz questão de lembrar.

Flip 2008
Mesa 11 - Guerra e paz - CHIMAMANDA NGOZI ADICHIE, PEPETELA
Dia 05/07, às 10h00
Mediador: JOSÉ EDUARDO AGUALUSA

Martín Kohan, Nathan Englander e Vitor Ramil

O argentino parecia americano e o americano parecia argentino. Para piorar, o livro do americano é ambientado em Buenos Aires. Mas o que importa mesmo é que ambas as leituras, de Kohan e Englander, foram boas. Apesar do tema que perpassa ambos os livros – a ditadura argentina – não me agradar em tese, fiquei com vontade de conhecer o trabalho deles.

O trabalho de Vitor Ramil é que define o título da mesa, melhor dizer “rótulo”, mas não parece guardar uma relação muito próxima com Kohan e Englander.

Flip 2008
Mesa 9 - Estética do frio - MARTÍN KOHAN, NATHAN ENGLANDER, VITOR RAMIL
Dia 04/07, às 17h00
Mediador: SAMUEL TITAN JR.

Noll e Martell

Ganhou a Lucrecia Martell com seu jeito espontâneo e o seu cinema “natural”, dado, e não construído, perseguido, buscado. É como se o cinema tivesse corrido atrás dela, ido buscá-la, e não o contrário. Definitivamente, quero assistir “O Pântano”, “A Menina Santa” e “A mulher sem cabeça”.

Noll é um tanto excêntrico demais para despertar afinidades. Já me deu um susto quando começou a leitura de um trecho dos seus livros, fazendo uma voz esquisita, lendo arrastado, como se estivesse incorporando um personagem. Uma pessoa idosa ou doente. Não estava, pois leu do mesmíssimo jeito um outro trecho de um segundo texto seu, cujo narrador era um menino. Mas gostei de ambos os trabalhos. Ou seja, os livros dele devem ser muito mais interessantes do que sua fala. O que faz todo sentido, afinal ele é escritor.

Flip 2008
Mesa7 - Ficções - JOÃO GILBERTO NOLL, LUCRECIA MARTEL
Dia 04/07, às 11h45
Mediador: SAMUEL TITAN JR.

Schultze, Carone e Naves

Ingo Schultze é simpático e aparentemente despretensioso. Fiquei com vontade de conhecer melhor o trabalho desse escritor alemão. Modesto Carone e Rodrigo Naves destacam-se como críticos, mas estavam ali para apresentarem seus trabalhos como escritores.

Os perfis dos componentes da mesa eram extremamente desiguais, o que prejudicou um pouco a fluência da conversa.

Flip 2008
Mesa 6 - Formas breves - INGO SCHULZE, MODESTO CARONE, RODRIGO NAVES
Dia 04/07, às 10h00
Mediador: CARLOS AUGUSTO CALIL

sábado, 5 de julho de 2008

Cíntia Moscovich, Zoë Heller e Inês Pedrosa

Ótimas. Leram trechos de seus livros, que pareceram muito interessantes. Mas, no discurso, no debate, Inês se destaca. Tem muita experiência nisso. Traquejo. É dura. Assertiva. Perspicaz. Incisiva. A aparência mais recolhida de início não dura muito. Ela gosta do debate.

A mesa foi ótima e o mais engraçado é que assisti por acidente. Comprei a entrada para uma amiga que chegaria no sábado. Mas o programa acabou sendo alterado e o debate aconteceu na quinta-feira.

Ainda conheci um outro autor português, José Luís Peixoto, que foi o mediador da mesa. Muito bom.


Flip 2008
Mesa 5 – Sexo, mentiras e videotape - CÍNTIA MOSCOVICH, INÊS PEDROSA, ZOË HELLER
Dia 03/07, às 19h
Mediador: José Luís Peixoto



Elizabeth Roudinesco

Uma história dos perversos ou “O lado obscuro de nós mesmos”. O tema, por si só, já era interessante. Na verdade, acho que nunca havia parado para pensar nisso.

Valeu a pena. Como tudo, a perversão também depende do contexto. Existe em contraponto a certa mentalidade histórica, ao comportamento ‘socialmente aceitável’, seja lá o que isso signifique.

Perversão não é fazer o mal, mas sim sentir prazer com isso. Distinção importante, feita por Roudinesco. Mas o melhor mesmo está no título – o lado obscuro de nós mesmos –, ou seja, somos todos perversos, o que não deixa de ser verdade.

Em vez de ler um discurso, falou com a platéia. Ótimo. Não gosto de quem só fica ali, lendo. É difícil prestar atenção.

Mas se perdeu ao tentar responder uma questão sobre o modo como ela tratou o terrorismo islâmico em seu livro. Acho engraçado isso de as pessoas fingirem que estão respondendo uma pergunta sem responder.

De resto, fiquei curiosa, com vontade de ler o livro dela, o que, em se tratando de mim, não quer dizer muita coisa. Mas acho pouco provável que eu conseguisse ler ele inteiro.

Flip 2008
Mesa 02 - O espelho - ELISABETH ROUDINESCO
Dia 03/07, às 11h45
Mediador: ELIANE ROBERT MORAES

Roberto Schwarz

Nunca mais ler um livro do mesmo jeito. O que é o livro? O que o autor planeja escrever, o que pensa que escreve, o que efetivamente escreve, o que os críticos dizem, o que eu leio, o que você lê. Quantas versões existem? Tantas versões quanto realidades. A realidade é assim também. Quem garante que o vermelho que eu vejo é o mesmo que você vê?

Tudo isso para falar do Schwartz. Parece tímido. Mal olha para o público. Desconfortável com aquela situação. Com todo aquele destaque. Mas apaixonado pelo seu tema.

No início, enquanto apenas lê o que trouxe escrito, fazendo pausas estratégicas para beber água e para que o público assimile seu discurso, ele parece mais tranqüilo, pois tem o domínio da situação. Depois que começa a falar, principalmente ao responder perguntas, ele parece mais real.

Tema: Machado de Assis. Especificamente Dom Casmurro.

Flip 2008
Mesa 1 – A poesia envenenada de Machado de Assis - ROBERTO SCHWARZ
Dia 02/07, às 19h – Conferência de Abertura
Mediador: Hélio Guimarães

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Estréia na Flip

Faz tempo queria vir. Na verdade, desde que ouvi falar da festa, já em sua primeira edição. Está na sexta. Passar cinco dias falando e ouvindo falar sobre livros, no meio de pessoas que se interessam por esse mesmo tema. A velha história do “gente como a gente”. Não sei se isso é verdade, mas já estava na hora de tirar isso a limpo.

Bom, estou aqui e estou gostando.

Viva Einstein!

Controle. Engraçado essa necessidade que a gente tem de controlar tudo, ou de achar que controla. Ou, pior, achar que tem que controlar. Para quê?

Não, nem adianta perder tempo tentando responder essa pergunta. Só valeria a pena saber qual seria a utilidade de se ter controle sobre tudo se isso fosse possível. Não é. Esse controle é impraticável.

Ainda assim, não consigo me livrar dessa idéia. É como se eu vivesse unicamente sob as leis de Newton, mesmo depois da teoria da relatividade.

Bom, resolvi tentar. Pelo menos com esse blog. Declaro, finalmente, a extinção das regras.

Não há mais regras para temas, para a extensão dos textos, para a linguagem, para a periodicidade das postagens, para nada.

Quem viver, lerá!