sábado, 12 de setembro de 2009

Trecho de "Syngué sabour / Pedra-de-paciência”, de Atiq Rahimi

' "Com tudo que lhe confessei ontem, você vai me dizer que desde pequena eu já era uma diaba. Uma diaba, para meu pai." Sua mão roça levemente o braço do homem, acaricia-o: "Mas para você... nunca fui isso, não é?" Ela balança a cabeça. "Sim... Talvez..." Um silêncio carregado de dúvidas e incertezas. "Mas tudo o que fiz... foi por você... Para que ficasse comigo." Sua mão desliza pelo peito do homem. "Não, não... para dizer a verdade, era para que você... para que você ficasse comigo. Para que não me abandonasse. Foi por isso, tudo o que fiz..." Ela interrompe a fala. Seu corpo se dobra e se encolhe virando-se para o lado, junto ao homem. "Fiz tudo o que podia para que ficasse comigo. Não somente porque eu o amava, mas para que não fosse abandonada. Sem você, eu não teria mais ninguém. Eu teria sido banida por todos." Ela se cala. Com uma das mãos, coça a têmpora. "Confesso que, no início, não estava muito segura. Não tinha certeza de poder amá-lo. Eu me perguntava como poderia amar um herói. Isso me parecia tão inacessível, como um sonho. Durante três anos fiquei tentando imaginar você... E depois, um belo dia, você chegou. E insinuou-se em minha cama. Em cima de mim. Esfregando-se contra meu corpo... Você não conseguia! E não ousava dizer sequer uma palavra. Na escuridão total, com nossos corações disparados, frenéticos, nossa respiração acelerada, nossos corpos suados..." Ela está com os olhos fechados. Está longe, muito longe daquele corpo inerte. Ela se afotga completamente na escuridão daquela noite de desejo. Sedenta. E lá permanece por algum tempo. Sem uma palavra. Sem um gesto.' - Págs. 75 e 76

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