Adoro ler. Mas não costumo ter vontade de chorar quando leio um livro. É diferente de um filme. Nos filmes, as imagens já vêm prontas, o diretor controla a duração de cada uma, a passagem de uma para outra, a iluminação da cena, cada gesto, olhar, som. Isso sem falar da trilha musical, que, sozinha, pode nos jogar da euforia à depressão, do riso descontraído à ansiedade.
No texto não. O autor não tem controle das imagens que formamos quando lemos. Ele apenas nos dá indicações, pistas mais ou menos claras. Por mais descritiva que seja a narrativa, cada leitor singular fará sua própria composição. Com ou sem música de fundo.
Por isso acho mais difícil levar o leitor às lágrimas do que o espectador. Causar impacto emocional imediato.
Não me entenda mal. Não acho que os filmes sejam mais ou menos emocionantes que os livros. Não se trata de uma competição. Depende do livro. Depende do leitor. Depende do momento, da ocasião, da temperatura, não importa.
Eu me lembro uma vez, ainda adolescente, quando tentei ler um livro do Stephen King e desisti. Fiquei com medo. E me senti ridícula por isso. O que não aconteceria se fosse um filme de terror.
Por isso me surpreendi com “Enterro Celestial”. Mais de uma vez tive que fazer um intervalo na leitura para não dar muita bandeira. (Uma maluca, com um livro na mão, derramando lágrimas sobre uma xícara de café!)
E não tive que segurar o choro por conta de alguma atrocidade: um espancamento, uma cena de tortura ou abuso sexual, um homicídio. Não. As lágrimas me vieram aos olhos porque uma mulher deu a outra uma perna de carneiro. (Não ria ainda. Leia o livro primeiro. Depois conversamos.)
Xinran, autora chinesa (mais conhecida por “As boas mulheres da China”), narra a história de Wen, também chinesa, que, no final dos anos 50, arrisca-se numa viagem ao Tibet em busca do marido desaparecido. A autora é jornalista, e a história nos é apresentada como sendo baseada no depoimento verídico dessa personagem, Wen.
Embora não se encontre, ao longo do texto, evidência alguma de que isso seja verdade – tanto o depoimento como a veracidade dele – isso pouco importa. A história é pretexto para nos mostrar um pouco do Tibet e da China, mas, principalmente, do embate entre culturas distintas – melhor seria dizer mundos.
Para o leitor brasileiro, é engraçado acompanhar a surpresa de Wen em face aos costumes tibetanos, uma vez que, para nós, os costumes chineses também podem ser bastante surpreendentes.
Estamos tão acostumados a enxergar a vida unicamente do nosso ponto de vista que acabamos ignorando o fato, mais do que óbvio, de que ela pode ser vivida de formas muito diferentes. E, principalmente, de que fazemos nossas escolhas, tendo ou não consciência disso.
“Enterro Celestial” é uma história de amor e tolerância. Comovente. Doce. Interessante. Vale a pena.
Ficha Técnica: “Enterro Celestial”, de Xinran, São Paulo: Companhia das letras, 2004.
terça-feira, 30 de outubro de 2007
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Um comentário:
SIL Adorei o blog..tem sua cara e esta muito bem escrito ..como sempre!!!! Amiga que sua vida seja repelta de cafés rsrs
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