terça-feira, 22 de setembro de 2009
sábado, 12 de setembro de 2009
Outro lugar
Durante encontro com Atiq Rahimi, no café da Martins Fontes, em julho deste ano, alguém perguntou a ele se, vivendo na França há tanto tempo, não sentia falta do Afeganistão. Antes de ouvir a resposta, emendou a pergunta questionando o autor sobre de que sentia falta quando estava no Afeganistão.
Rahimi respondeu que, quando estava na França, sentia falta do Afeganistão e, quando estava no Afeganistão, sentia falta da França. Em resumo, segundo ele, sempre queremos estar em outro lugar.
Às vezes me parece que a insatisfação é uma espécie de mola propulsora. Afinal, quem está satisfeito, não vai a lugar algum.
Viver insatisfeita, portanto, pode ser bem divertido.
Syngué sabour / Pedra-de-paciência
Romance de Atiq Rahimi, ganhador do Goncourt, em 2008. A história se passa no Afeganistão. Mais exatamente na sala da casa de uma família afegã, numa zona turbulenta que, aos poucos, é abandonada por seus antigos habitantes.
Um homem jaz, deitado rente ao chão, com uma bala na nuca. Ao seu lado, a mulher, a esposa. Ele em estado vegetativo, sem esboçar qualquer reação. Ela no limite da exaustão e da razão. E é esse o pretexto do autor para falar da vida em seu país. Em especial, da vida das mulheres.
A sensação de aprisionamento é permanente. Pela imobilidade da câmera do narrador, que não deixa o quarto. Pela inatividade do homem, que apenas respira. Pela impossibilidade de afastamento da mulher, que simplesmente não pode deixar o marido.
Em “Syngue Sabour“, viajamos para longe. Muda-se o cenário. As regras de conduta também. Assim como os preceitos religiosos e os valores de bem, mal, justiça, injustiça, certo, errado, moral, imoral. Mas a matéria-prima é sempre a mesma. O ser humano com todas as suas contradições.
Tente ler o livro sem o crivo da sua própria cultura. Tente imergir no mundo alheio. Tente descobrir como você agiria se aquele fosse o seu universo. De algum modo, acho que somos apenas versões de um mesmo tema.
A pedra-de-paciência, referida no título, é uma pedra mágica, capaz de absorver todas as lamúrias dos homens, todas as dores, todas as lágrimas, todos os medos. Até explodir, destruindo, com isso, tudo que ficou preso nela e libertando os homens de todo o mal.
Ficha técnica: “Syngué sabour – Pedra-de-paciência”, de Atiq Rahimi, Ed. Estação Liberdade (2008)
Trecho de "Syngué sabour / Pedra-de-paciência”, de Atiq Rahimi
A verdade
Andei lendo sobre isso. O caminho para se alcançar a verdade. A busca da verdade. A verdade, a verdade, a verdade.
Desculpe, mas, que raio é isso? A verdade de quem para quem para quê? Essa verdade da qual falam os livros soa para mim como aquela bola de chumbo presa aos pés dos irmãos Metralha.
segunda-feira, 7 de setembro de 2009
Morreste-me
Não sei dizer o que é. Talvez uma carta de despedida. Dolorida e triste. Na verdade, um registro. Do amor entre pai e filho e filho e pai. O sentimento escapa pelos vãos das palavras, condiciona a forma. E por que haveria de ser diferente?
Morte e perda são inevitáveis na vida. E temas recorrentes na literatura, como não poderia deixar de ser. Mas, nesse caso, é difícil dizer se o relato é pessoal ou ficcional. O autor fala da doença e da morte do pai. Fatos reais, parte de sua biografia.
Não que confundir realidade e ficção seja ação estranha à atividade literária. Pelo contrário, são sua argamassa. Mas, em geral, trata-se de costura invisível, difícil de detectar. Em “Morreste-me”, isso não acontece.
“Orienta-te, rapaz!”
“Oriento-me, pai.”
Ficha técnica: "Morreste-me", de José Luís Peixoto.